Práticas restaurativas no âmbito socioeducativo

A atuação no âmbito do sistema socioeducativo requer constante reflexão e formação por parte de gestores e profissionais, sobretudo no atual contexto em que uma cultura de opressão e intolerância ganha espaço na sociedade, fortalecendo perspectivas cada vez mais punitivistas e de naturalização da violência.

Herança do ideário menorista, a maior parte das unidades de privação de liberdade e semiliberdade nunca se adequou inteiramente ao que preconiza o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA, Lei nº 8069/90) e o Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo (SINASE, Lei nº 12.594/12). Dados da publicação “Panorama da Execução dos Programas Socioeducativos de Internação e Semiliberdade nos Estados Brasileiros”, produzida pela Comissão da Infância e Juventude do Conselho Nacional do Ministério Público, apontam que as unidades mantêm instalações inadequadas – alojamentos precários, esgotos aparentes, ausência de espaços para atividades e celas de isolamento -, e práticas incompatíveis a uma política de atendimento comprometida com a garantia dos direitos humanos de crianças e adolescentes – violências físicas e psicológicas, situações de abuso sexual, superlotação.

A superlotação do sistema, por si, já consiste em uma violência estrutural que impossibilita o cumprimento da medida em sua concepção socioeducativa e potencializa a ocorrência de violações de direitos humanos fundamentais dos adolescentes internados. Nesse sentido, havemos de celebrar a decisão da Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) na última sexta-feira (21/08), que determinou o fim da superlotação em unidades do sistema socioeducativo de todo o país.

Nova parceria: Iases

É também motivo de celebração a construção de parceria que o Instituto Terre des hommes Brasil vem desenvolvendo com o Instituto de Atendimento Socioeducativo do Espírito Santo (Iases) com a perspectiva de implementação de práticas restaurativas no Instituto. No contexto de limitações impostas pela pandemia, algumas ações estão por hora suspensas e outras adaptadas para o momento, como processos formativos, importante estratégia para o fortalecimento de parceiros e instituições. É o caso da capacitação realizada na última terça (25/08), com profissionais do Iases e da Secretaria de Estado da Educação do Espírito Santo (Sedu).

Com o objetivo de partilhar lições aprendidas e experiências, foram apresentadas as estratégias de prevenção da violência no contexto comunitário, a partir da experiência do Projeto “Mucuripe da Paz” e as estratégias da abordagem restaurativa na privação de liberdade, tendo a justiça restaurativa como fundamento. O momento foi facilitado pela assessora técnica Paula Rodrigues e pela coordenadora de projetos Renata Araújo.

Para Lutz Franthesco da Silva, gerente de medidas socioeducativas do Iases, a avaliação do momento é positiva: “as facilitadoras trazem experiências vivenciais muito práticas que dialogam com a nossa realidade local, que dialogam com uma perspectiva ética que a gente defende enquanto gestores da socioeducação. A gente tem trabalhado muito com a construção coletiva dos processos e as reflexões possibilitadas foram muito boas, tanto que a repercussão foi enorme, muito maior do que eu esperava”.

MAIS POSTS