Racismo Ambiental: desafios e dilemas que impactam a população brasileira  

Somente 24% da população brasileira já ouviu sobre o termo Racismo Ambiental ou sabe o que é (Foto: Reprodução/Internacional da Amazonia)

Apenas um em cada quatro brasileiros sabem o que é ou já ouviram falar sobre o termo “Racismo Ambiental”. Este levantamento realizado pelo Ipec (Inteligência em Pesquisa e Consultoria Estratégica) a pedido do Sistema de Educação por uma Transformação Antirracista e do Instituto de Referência Negra, aponta uma realidade preocupante na qual a maior fatia da população brasileira desconhece uma temática tão importante no que versa as condições dignas de vida.  

A assessora técnica do Instituto Terre des Hommes (TdH) Brasil, Vanessa Silva, avalia que índice é um retrato do quão as políticas ambientais ainda são pouco discutidas comparado a outras políticas públicas. “E, quando se trata de racismo, devemos ressaltar a sua forma de estruturar a sociedade, ou seja, de ter efeitos sobre várias áreas como a econômica, a social e, inclusive, a ambiental”, acrescenta. 

“Junto a isto há ainda pouca representatividade negra nos espaços de discussões e tomadas de decisões a respeito dos impactos ambientais. Apesar do tema está sendo mais debatido atualmente devido às consequências das mudanças climáticas, é a população negra a primeira  afetada, tendo em vista a vulnerabilidade social que a maioria vivencia advinda ainda do período de escravidão no nosso país”, destaca Vanessa Silva.  

A assessora técnica do Instituto TdH analisa que um dos principais gargalos enfrentados atualmente para o avanço de pautas e políticas públicas eficazes neste âmbito do racismo ambiental é a falta da compreensão da integração da natureza com a vida. “Não se trata de uma luta por algo externo a nós, mas algo que faz parte de nós e é necessário para a sobrevivência humana. Não sobreviveremos sem água ou com o ambiente poluído. Isto para destacar um exemplo básico e ao mesmo tempo primordial”, detalha Vanessa.  

Vanessa aponta, ainda, como outro gargalo, a “lógica capitalista que incentiva o consumo desenfreado e é divulgada como sinônimo de avanço”. Para ela, “isto colabora com a produção excessiva de resíduos que, sem destinação final apropriada, poluem os recursos naturais”.  

“O modo como exploramos a natureza para produzir e consumir afetam principalmente os grupos que vivem em condições mais adversas. Por fim, o racismo é um dos gargalos que precisa ser enfrentado para que alcancemos ambientes mais igualitários e ao mesmo tempo com respeito às diversidades presentes em cada território”.  

Para debater de forma mais profunda essa temática, Vanessa faz um resgate histórico, do qual, segundo ela, é preciso entender a forma que a sociedade foi estruturada ao longo das décadas. “O racismo se faz presente em muitas práticas inter-relacionais por estruturar a nossa sociedade, sendo assim introjetado na subjetividade individual e social. Ou seja, há muitas percepções racistas que são naturalizadas e isso leva a uma insuficiente problematização de algumas situações”, alerta.  

No caso do racismo ambiental, completa Vanessa, são as formas precarizadas e/ou negligentes por parte do poder público e pela sociedade em geral, que é tratado o ambiente (modificado ou natural) onde moram maior número de pessoas negras. “Nesse sentido, é possível considerar uma lógica social de priorizar impactos ambientais justamente nos territórios onde se encontra esta população”, diz.  

Se pensarmos por exemplo na necessidade de construir um viaduto para viabilizar o fluxo de carros em determinada área, provavelmente entre derrubar um condomínio de luxo ou casas de uma comunidade socialmente mais vulnerável, será escolhida a comunidade. Neste exemplo é possível visualizar uma concepção de desvalor de pessoas negras ue estão em desvantagem social compondo territórios mais periféricos, em detrimento da predominância de pessoas brancas nos espaços de luxo e poder”. 

Ao fazer essa macro análise sobre o tema, Vanessa aponta que “a educação antirracista quando integrada à educação ambiental pode proporcionar um olhar crítico às formas em que se fazem ocorrer o racismo ambiental. Uma vez que temos uma sociedade mais crítica nesse sentido, certamente estaremos a passos mais curtos da justiça socioambiental”. 

Papel das escolas e dos jovens  

Quando questionada quanto ao papel da comunidade escolar neste processo de informação sobre o Racismo Ambiental, a assessora técnica do TdH, Vanessa Silva, avalia que as escolas possuem fundamental importância neste processo.  

“As escolas são preponderantes pois estarão colaborando para a construção de cidadania à medida em que trabalham o respeito a diversidade em todas as suas formas de existir. Não temos como ter adultos e profissionais comprometidos com o Planeta Terra e os seres que o habitam sem educação para tal. Ressalta-se aqui a importância de uma educação antirracista e ambiental permanente e integrada com o todo da escola e não apenas como ações pontuais”, avalia.  

jovens também podem ser protagonistas deste mudança social (Foto: Banco de Imagens TdH)

Se as escolas têm papel de destaca neste processo revolucionário, Vanessa acredita que os jovens também podem ser protagonistas deste mudança social. Primeiro, é preciso destacar que os jovens, principalmente os que vivem em situação de pobreza, “são também um dos mais afetados em relação ao racismo ambiental”, recorda Vanessa. Isto porque, completa a assessora, “[eles] necessitam transitar em espaços precarizados e, portanto, são alvos de doenças advindas de um ambiente descuidado, por vezes com a presença de lixo e vetores de doenças, falta de saneamento básico, e de espaços de lazer e convivência comunitária apropriada”. 

Além disso são alvos mais fáceis às formas de violências por utilizarem esses mesmos espaços precarizados com o intuito do lazer, fato que propicia a opressão policial, esta que atua de forma racista e numa concepção de desvalor a territórios mais vulneráveis, tendo em vista que maior parte dos jovens do nosso país que são encarcerados ou que morrem por homicídios, são jovens negros, segundo Atlas da violência”. 

Neste sentido, aponta Vanessa, “essa juventude quando tem acesso à informação, oportunidade de construir conhecimento e agir em coletivo, pode buscar melhorias para seus territórios com a potência das percepções autênticas de quem vivencia a realidade atravessada pelo racismo ambiental. Desse modo, os jovens podem atuar se auto-organizando de forma a protagonizar a sua realidade, ocupando espaços de discussões onde podem pautar suas necessidades. Podem protagonizar ainda práticas no viés da educação ambiental e disseminá-la para a comunidade, colaborando para que mais pessoas possam incidir politicamente para melhorias dentro dos territórios”.   

TdH abraça a problemática 

Diante do compromisso histórico de garantir uma melhor qualidade de vida aos jovens e adolescentes, o Instituto Terre des Hommes (TdH) Brasil desenvolve, desde o ano passado, o projeto Saúde Ambiental, cujo um dos objetivos é o de sensibilizar a sociedade para as condições de risco social e pessoal das crianças, dos adolescentes e dos jovens e, também, lutar pela melhoria das suas condições de vida através de assistência direta, de projetos de formação e de informação, de incidência política. 

Esse último ponto, a da incidência política reverbera diretamente na temática do racismo ambiental. Vanessa explica que o objetivo é construir uma rede de jovens que já atuam dentro das pautas ambientais de forma que possam compartilhar experiências e fortalecer a luta socioambiental no nordeste do Brasil. “Há todo um suporte da Instituição a esses jovens, o que inclui formações de diversos temas, no qual um deles é o Racismo Ambiental”, conclui Vanessa Silva.  

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